quinta-feira, 24 de setembro de 2009

MEU PADRASTO ME ASSEDIA 2

Naquele dia chegou em casa muito atrasada. Já eram mais de duas horas e o João tinha saído. Talvez tivesse ido ao Banco pagar alguma conta ou ao Bar tomar a sua cerveja. Ou talvez, o que era pior, tivesse saído para segui-la desde a escola.
Não se importou. Tomou um banho, comeu alguma coisa e foi para o quarto, trancou a porta buscou o seu diário e escreveu:

“Querido diário, hoje é quinta-feira e eu estou muito feliz. O Julio me cobrou uma resposta sobre o namoro com ele e eu criei coragem e disse que sim. Eu disse que teria que ser um pouco escondido, e a gente só se encontrar depois da aula, e com muito cuidado (para não ser visto pelo João, caso ele viesse me seguir).
Eu ainda não tive coragem de falar sobre o João, mas eu acho que ele se acalmou. Eu não conversei mais com ele desde terça-feira. É bom que nem apareça mesmo. Pensa que é meu dono e fica querendo por a mão em mim. Eu quero é ficar com o Julio, espero que esse cara não atrapalhe a minha vida com ele.”

Um barulho de porta a fez parar por um instante. O João Luis estava de volta. Ficou a ouvir seus movimentos: entrou, foi ao banheiro, abriu a geladeira e tomou água. Movimentou-se até o quarto e quietou-se.
Clarissa agradeceu a Deus. Mais um dia sem perturbação. Ela sabia que estava correndo risco chegando tarde em casa, mas valia a pena ficar um pouco mais com Julio.
Eram mais ou menos sete horas da noite quando a sua mãe chegou. Bateu na porta e foi para a cozinha. A Clarissa levantou-se , foi ao banheiro, lavou o rosto e foi dar um beijo em sua mãe.
Maria Lúcia olhou para a filha e sentiu algo diferente em seus olhos. Não comentou nada, pediu ajuda no preparo do jantar e segui reclamando do cansaço do dia de trabalho e dos ônibus lotados no transporte.

- Como vai indo na escola, filha? A gente nem se vê direito de manhã! O João Luis disse que foi te buscar outro dia. Ele está preocupado de você vir sozinha da escola. Tão falando de um tarado que tem atacado as crianças da escola. Tem uma colega que mora em Sumaré, disse que lá já atacaram duas moças que estuda à noite, uma foi levada lá pra estrada do Horto Florestal e a outra não acharam ainda. Eu falei pro João Luis, quando ele estiver fazendo o turno da noite, ele levanta um pouco mais cedo e vai te buscar na escola.
- Não, mãe, não precisa não. A escola nem é tão longe e a gente vem com bastante colega. As vezes agente até se desencontra. Eu nunca sei se ele vai me buscar, ele não avisa!
- É mas e bom a gente ficar atenta. Não custa nada, ele só sai pra trabalhar depois das quatro.
- Se ele me avisar eu fico esperando ele. – Completou Clarissa, se lembrando da conversa que teve com o João na segunda-feira.
- E as notas, tão boas? Vai se formar mesmo? O meu patrão disse que o irmão dele está esperando você para cuidar do filho. Eles moram lá no centro mesmo. A mulher vai dar a luz em setembro, eu acho. Em janeiro você já pode começar a trabalhar e ganhar o seu dinheirinho.
- Eu não sei se eu quero trabalhar, mãe. Eu queria continuar estudando, fazer o colegial e prestar vestibular pra faculdade, você sabe. A Irmã da minha colega está fazendo Economia na PUC, eu queria fazer Psicologia, a professora Sandra disse que eu tenho jeito.
- Você sabe quanto custa fazer uma faculdade hoje em dia? A gente não tem condições de pagar não! E outra coisa, só o dinheirinho que eu ganho e mais o pouco que o João ajuda, não tá dando pra manter a casa não. O João está pensando em comprar um carrinho pra nós passearmos. Eu estou apoiando a idéia, a gente não sai pra lugar nenhum...

A mãe continuou falando, mas Clarissa já não ouvia mais, ela estava pensando agora no Júlio que de todos era o mais sensato. Ele sim incentivava-a a estudar e buscar a formação universitária. Ele sim sabia entender o seu olhar sem palavras no pedido de socorro nas horas de angústias e mágoas. Só ele sabia ouvir o seu coração nos momentos de ansiedade e de perguntas sem respostas.

Após o jantar Maria Lucia foi para a sala ver televisão e a menina Clarissa seguiu para o seu quarto, pegou uma revista feminina entre os cadernos da escola e passou a folheá-la . Uma página chamou a sua atenção: falava dos problemas no relacionamento sexual de jovens e suas conseqüências, o uso de preservativos e métodos anti-concepcionais. Leu com muita atenção e não deixou de pensar na sensação estranha que sentiu quando o Júlio lhe beijou. Foi uma sensação estranha, mas gostosa, de um prazer proibido, diferente.
Continuou folheando a revista sem muito interesse até que a jogou para um lado e agarrou o seu diário e escreveu:

“Minha mãe não quer que eu me forme na faculdade. Ela quer que eu seja como ela, de ficar ralando pelas fábricas da vida. Foi ela quem mandou o João Luis me vigiar na escola, eu tenho que tomar mais cuidado pra encontrar com o Julio, eu não sei não, mas eu acho que hoje ele me viu na saída da escola. Se minha mãe sabe que eu estou de paquera com o Júlio ela me tira da escola e me põe pra trabalhar, ela já falou isso outro dia. Eu vou me cuidar mais. Minha mãe disse que tem um tarado atacando moças estudantes à noite. Lá em Sumaré já atacaram duas. Eu tenho que me cuidar é aqui em casa. Minha mãe não sabe, mas tem um tarado morando aqui, e ele já me atacou, e se eu não me cuidar ele pode querer abusar novamente e querer me passar a mão de novo.
Eu descobri hoje,numa revista, que os meninos estão usando camisinha pra fazer sexo com as meninas. A revista fala que é pra evitar doença venérea e também pra evitar gravidez. Eu não sei, mas eu acho que quem tem que usar essas coisas é aquelas meninas “biscate” que anda com tudo que é menino. Eu só quero beijar o Julio, e já muito bom demais.”

Guardou o diário, debaixo do colchão, pegou o livro de história, leu um pouco da matéria que iria cair na prova, fez uns exercicios de matemática e foi dormir. Quem a acordava de manhã para a escola era a mãe, que todos os dias ao sair para o trabalho, batia na porta e punha de pé.
Naquela sexta-feira teria prova de História e já tinha combinado com o Julio de se encontrar na saída, mas já tinha pensado melhor e resolveu falar com ele pra deixar para se encontrar outro dia até que tivesse certeza das visitas do João Luis na escola. Vestiu uma calça Jeans e a blusinha branca do uniforme e foi. Na escola correu tudo bem, falou com o Julio na hora do recreio e fez a prova de história

Na hora da saída foi direto pra casa. Ao abrir a porta já deu de cara com o Padrasto de pé no corredor:
- Veio fazer o almoço pra mim hoje? Tava aqui te esperando. Não quis ficar com seu “cabeludinho” hoje? Faz aí um rango gosto pra nós, que depois eu quero conversar com você..

Clarissa, ficou olhando nos olhos dele enquanto ele falava. Ele tinha um olhar firme e seguro mas a voz dele deixava claro que já havia bebido e estava alcoolizado. Nada respondeu, desviou-se, entrou para o seu quarto e não suportando a emoção daquele momento, deitou de bruços na cama e chorou. Ela sabia o que a esperava. Se não saísse do quarto pra fazer o almoço para ele, certamente iria falar pra sua mãe sobre o Julio e corria o risco de ter que parar de estudar. Não queria separar do namorado, pois ele estava sendo muito importante para ela naquele momento. Levantou-se ainda soluçando, trocou de roupa e foi para a cozinha.

Antes que ele o chamasse para almoçar o João Luis veio sorrateiramente para o cozinha e ficou observando a Clarissa mexer na cozinha. Ela percebeu a presença dele e ficou nervosa deixando a escumadeira cair no chão, e ele não perdeu tempo:
- Calma, não precisa ficar nervosa. Eu estou só olhando. Você tá bonitinha aí de dona de casa. Tô gostando de ver. Nós vamos se dar bem, você vai ver. A gente só precisa conversar. É conversando que a gente se entende...

Em silencio Larissa continuou preparando a salada na mesa. Seus olhos começavam a brilhar novamente e uma lágrima brotou como um cristal. Ela não queria que ele a visse chorando: pegou um pape toalha e discretamente enxugou os olhos, suspirou fundo e pegou os pratos.
- Pode vir almoçar, já está pronto, disse saindo.
- Peraí, fique aqui pra nós conversar um pouco. Você não vai comer? Senta aí pra almoçar comigo!
Larissa resistiu um pouco, mas de tanto que ele insistiu que acabou concordando, apesar de saber o que vinha pela frente. Pegou um prato, colocou um pouco de salada e começou a comer lentamente olhando para o prato sem dizer nada. O João não tirava o olho dela enquanto comia. Depois de alguns minutos a observá-la, pegou o seu queixo com a ponta dos dedos, forçou a sua cabeça para cima e perguntou:
- Porque você não olha para mim, você está com medo de mim? Não precisa ter medo não, eu não sou nenhum bicho papão, eu só quero fazer um acordo com você.
- Eu não quero fazer acordo nenhum com você, João. – Disse Larissa com a voz alterada. – E não tenho nada pra conversar com você. Você para de me perseguir que eu vou acabar contando pra mamãe que você me agarrou e você vai se dar mau. Eu não tenho medo de você.
- Calma, falou baixinho o João Luis. – Não precisa gritar. Vamos conversar que nem gente grande. Eu sei tudo da sua história com aquele “cabeludinho”. Eu vi você agarrada com ele perto da escola e foi por bastante tempo. Desta vez eu vi muitos beijos.
- Você não viu nada, disse já nervosa a Larissa. Você está inventando isso para me fazer chantagem e complicar com minha mãe. O Julio é só um colega de escola!
- Um coleguinha com muita intimidade! Eu sei o que eu vi. – Afirmou João. – Mas se você fizer direitinho conforme o nosso combinado, ninguém precisa ficar sabendo. Só tem uma coisa: você tem que confirmar com tua mãe que eu tenho ido te buscar todos os dias. – definiu.
- Mas o que você quer de mim? Já não basta te fazer essa droga de almoço todo dia, e ter que agüentar a sua presença na minha frente me enchendo? – Falou se levantando para guardar os pratos na pia.
- Eu só quero que você seja boazinha comigo. Me trate bem, cuide das minhas coisas quando sua mãe não puder e seja carinhosa comigo. Só isso
- Tá bom. Tomara que seja só isso mesmo. Olha aqui, eu vou fazer as coisas pra você, mas não precisa ficar me enchendo todo dia. Deixa eu viver a minha vida em paz. Você não tem nada que se meter na minha vida. Posso ir?
- Pode, depois que deixar a cozinha arrumada. E não se esqueça: seja mais educadinha, é melhor para você. – João falou se levantando e saindo pra sala.

Clarissa terminou a arrumação na cozinha, serviço que antes era o João Luis quem fazia antes de ir para o trabalho, entrou para o seu quarto, pegou o seu diário debaixo do colchão e escreveu:

“Hoje é sexta-feira. O João está fazendo chantagem comigo por causa da minha paquera com o Julio. Ontem ele esteve lá na escola e viu tudo: os abraços e os beijos e agora está querendo que eu faço o almoço pra ele todo dia, limpe a cozinha, seja “boazinha” e carinhosa pra ele. Eu não entendi o que ele quer dizer com ser “boazinha”. Eu acho que ele quer me fazer de empregada dele, enquanto ele fica dormindo no sofá e tomando cerveja. Mas e se ele quiser outras coisas? Eu estou ficando com medo dele. Eu preciso dormir um pouco. Amanhã eu não vou na escola, já estou morrendo de saudade do Julio.”

As batidas na porta acordaram Clarissa de sobressalto:
- Clarissa, acorde, venha aqui me dar um abraço! – Era o João Luis que antes de sair para o trabalho, resolveu cobrar mais uma tarefa da Clarissa.
- Venha logo! – Falou com a voz de quem havia tomado um pouco mais de cerveja.
- Dar um abraço, que estranho – pensou Clarissa.- O que está acontecendo?
Clarissa abriu a porta ainda meio sonolenta e encontrou João em frente à porta do seu quarto com os braços abertos:
- Venha, me dê um abraço, que eu já estou indo trabalhar.
- Abraço? Você está louco, João? Bebeu demais?
- Não estou louco não. Eu vou querer um abraço todos os dias antes de ir trabalhar. E você não negar um abraço, vai?
Clarissa ficou olhando para ele por alguns instantes, pensou em voltar para o quarto, mas meio receosa, decidiu atender ao pedido e deu um passo à frente.
O JoãoLuis caminhou para o seu lado, abraçou-a como se quisesse apertá-la mas não o fez, ao contrário, abraçou-a carinhosamente afagando os seus cabelos. Clarissa não entendeu nada, não sabia se retribuía o afago ou se o empurrava longe dos seus braços. Não precisou nenhuma reação dela, ele a beijou no rosto, disse tchau e se foi.
Clarissa ficou a olhar o Padrasto seguir em direção à porta, sair para fora e caminhar em direção ao portão. Ficou parada por algum tempo sem entender nada, depois caminhou até o portão e ainda pode ver o homem que a abraçara sumir na esquina da rua transversal.
Foi para o quarto, deitou-se na cama e ficou olhando para o teto a pensar naquele abraço como uma vaga lembrança do seu pai que fora embora sem ao menos tê-la conhecido. Mas qual seria a intenção do João Luis? Dormiu e só acordou com a chegada de sua mãe. Queria falar para ela sobre o que acontecera, perguntar a ela sobre o seu pai, mas não teve coragem.

No outro dia era sábado, sua mãe estava de folga e iria ajudá-la a fazer faxina na casa, mas ainda deu tempo para escrever no seu diário:

Hoje é sábado, estou morrendo de saudades do Júlio, não sei se vou agüentar dois dias sem vê-lo. O João não está em casa (graças a Deus).”

Continua na próxima postagem...

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